segunda-feira, abril 08, 2019

Especialista do Ipea vê necessidade de mudanças diante do aumento da população idosa

Mattheus Angelo Alves Lopes
PUC-Campinas

VIII Conferência Municipal de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa
de Campinas realizada na Unicamp no mês de março
“Quando você mexe na Previdência, você mexe no mercado de trabalho”, afirmou, em entrevista telefônica, Ana Amélia Camarano, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e doutora em demografia que, nos últimos 20 anos, tem concentrado suas pesquisas na área de envelhecimento populacional - “e ela (a reforma) não está focando no mercado de trabalho e nas suas consequências”, diz.

Camarano afirmou que está produzindo uma pesquisa sobre dificuldade de inserção do trabalhador com idade avançada no mercado de trabalho. “Gosto de chamá-los de nenéns; nenéns maduros”, diz, fazendo uma analogia com a vida infantil, sublinhando que o mesmo deveria ocorrer com pessoas de idade avançada.

“Eu acho que, com a reforma, deveria se desenvolver uma política pública de recapacitação desse trabalhador que está com dificuldade de entrar no mercado de trabalho... pois um argumento do preconceito é a dificuldade de o idoso acompanhar as mudanças tecnológicas”, acrescentou.

A partir dos 60 anos, as pessoas se planejam e se consideram em um período de repouso e de busca do bem-estar físico e mental, principalmente os que têm uma dependência de terceiros. Quando questionada se a sociedade está preparada para receber esse grupo, Ana Amélia aponta: “a área de cuidados, é onde praticamente não se tem políticas públicas para amparar. Tanto a Constituição de 1988 como a Política Nacional do Idoso dizem que a família é a principal responsável pelo idoso dependente, mas o Estado não tem feito nada para ajudar essas famílias a cuidar”, apontou Ana Amélia.

Em Campinas, mudanças e exigências sobre o papel do idoso estão sendo reformuladas. No mês de março, nos dias 28 e 29, ocorreu a VIII Conferência Municipal de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa de Campinas, programada pelo Conselho Municipal do Idoso (CMI), com o tema “Os Desafios de Envelhecer no Século XXI e o papel das Políticas Públicas”, no Centro de Conferências da Unicamp.

Pressão demográfica
A população idosa tem crescido durante os últimos anos, causando variações na estrutura socioeconômica brasileira. Em 2010 o número de pessoas com mais de 60 anos na região de Campinas era 12.39%. Já em 2019, havia subido para 15.93% de acordo com a Seade. O levantamento também aponta para os níveis de envelhecimento populacional; em 2010, 64.25%, e em 2019, 90.71%. Ainda, a taxa de natalidade caiu desde 2000, que desde então passa por variações inexpressivas desde 2005, 13.61% a 13.47% em 2017.

Esses dados apontam a necessidade de adaptação que o País terá de enfrentar como parte essencial integradora de um recorte populacional que expressara aspectos ainda não reformulados pelos conceitos sociais e o mercado trabalhista, sendo o segundo de expressão relevante como impulsionador econômico, visto que a população idosa ocupara mais espaços sociais, evidenciado pela projeção populacional realizada pelo IBGE. Em 2045, a população do Estado de São Paulo com 60 a 64 anos terá crescido de 4.8% (2018) para 6.51%, e os dados só têm de aumentar quando analisados até o ano de 2060, limite máximo da projeção, sem incluir ainda os grupos acima de 64 anos.

De acordo com a Reforma da Previdência apresentada pelo presidente Jair Bolsonaro, a mulher terá que ter idade mínima de 62 anos para se aposentar, e o homem 65. O tempo de contribuição sobe para 20 anos (idade mínima é a mesma para funcionários públicos e privados) e o aposentado só recebera 100% do benefício se pagar ao INSS por 40 anos, sendo mais um aspecto que levara mais idosos na busca de cargos trabalhistas.

Fora as alterações trazidas em âmbito bruto e factual, a Reforma apresentada também traz desfalque social. Para o idoso competir em vagas de trabalho é mais dificultoso, sendo uma argumentação baseada no fato de ele não ser mais capaz de acompanhar as novas interações sociais e se desenvolver enquanto empregado, causando uma preferência pelo indivíduo de idade mais nova. Entretanto, o número de jovens não vem se equiparando ao crescimento senil, formulando um paradigma econômico, já que se aqueles que têm 60 anos ou mais serão uma grande parcela na população, mas os mesmos não ocuparão cargos trabalhistas por conta de um preconceito social.

Cooperação
Ianê Nogueira do Vale, 67 anos, ex-docente na faculdade de enfermagem da Unicamp e que hoje comanda a Vale Amamentar, empresa de consultoria que atende mulheres no pré e pós-parto. A cooperação de pessoas mais novas e mais velhas é um ponto inicial da consultoria. Impulsionada por uma ex-aluna de 26 anos, hoje socia, que instigou Ianê a participar do projeto, é um ponto ressaltado na entrevista, que une a vontade da primeira, com a experiência da segunda. Relatando um acompanhamento realizado, a ex-docente fala da dificuldade que sua socia estava tendo em um atendimento e como sua bagagem de conhecimento técnico foi essencial no encaminhamento por ser mais experiente, para que a mãe atendida se desenvolvesse – “É nesse sentido que cooperação jovem e idoso dá certo; se eu não tivesse essa jovem comigo eu não teria estruturado a Vale Amamentar, não teria energia pra gerenciar as redes sociais. Eu preciso dela, e ela precisa de mim. A integração ocorrida por meio de uma jovem, indica a formação de um novo produto até então não esperado por uma pessoa acima de 60 anos onde se é esperado uma retração trabalhista por parte do indivíduo. “Olha eu tenho certeza que eu não sou normal.” Brinca, quando questionada sobre sua idade e o mercado de trabalho – “Por ter trabalhado a vida toda, eu nunca sonhei em ser uma dona de casa. Claro, eu faço aula de tricô e atividades consideradas caseiras, mas se a casa está bagunçada e tenho coisas mais importantes e prazerosas pra fazer com relação ao meu trabalho, a casa fica bagunçada. Pra mim sempre foi imperioso ter uma atividade.”

A Educação é um tópico polêmico em relação às pessoas idosas. Entretanto, assim como mostra em um projeção populacional realizada pelo IBGE, em 2045, a população com 60 a 64 terá crescido de 4.8% (2018) para 6.51%,e o dados só têm de aumentar quando analisados até o ano de 2060, limite máximo da projeção. A falta de inclusão nas áreas da educação também deve ser englobada. “Quando eu me aposentei, procurei um programa chamado UniversIDADE. É feito pela Unicamp e por professores que oferecem aulas pra pessoas com mais de 50 anos. Uma das disciplinas que eu fiz chamava ‘Jogando Videogame’ com uma classe cheia de idosos. Isso me faz acreditar que é possível sim, um idoso estudar e se engajar na sociedade atual”, aponta.

Com a junção de políticas públicas e conceitos sociais sendo renovados, a população mais velha é colocada sob uma nova perspectiva que a vê não como estorvo ou um atraso econômico e social, mas como uma parcela disponível para gerenciamento de atividades diversas. Do tricô ao videogame, o idoso é a prova da adaptação humana e da necessidade de o Estado oferecer base para estes. “Ser idoso é uma oportunidade de se redescobrir” finaliza Ianê.

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